terça-feira,
15 de abril de 2025

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Levantamento do Tribunal de Contas mostra falhas de órgãos que atendem crianças e adolescentes vítimas de violência no ES

Redação

Crianças e adolescentes que são vítimas ou testemunhas de violência no Espírito Santo correm um alto risco de revitimização, ao receberem as políticas públicas dos entes que fazem parte do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente (SGDCA), constatou um Levantamento do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo (TCE-ES).  

Nessa fiscalização, o tribunal identificou relevantes problemas à eficácia e à segurança do sistema de enfrentamento de violência contra crianças e adolescentes, e apontou a urgência de ações estruturantes para fortalecer a rede de proteção e garantir um atendimento integrado e qualificado que assegure a proteção e o bem-estar de crianças e adolescentes em situação de violência. 

O processo foi julgado na sessão virtual do Plenário da última quinta-feira (3), conforme o voto do relator, conselheiro Rodrigo Chamoun.  

O Levantamento analisou as ações e políticas públicas desenvolvidas pelos entes do Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente. No trabalho, foram fiscalizados apenas os entes de nível estadual, abrangendo portanto o Poder Executivo do Estado do ES; o Ministério Público do Estado do ES; a Defensoria Pública do Estado do ES e o Tribunal de Justiça do Estado do ES, no período de 2023 a 2024. 

No Espírito Santo, de acordo com dados da Secretaria de Segurança Pública (Sesp), foram registrados 4.502 boletins de ocorrência de crimes diversos contra crianças e adolescentes no ano de 2023. Já de janeiro a agosto de 2024, o número foi de 2.806 casos. Entre eles, ameaça, corrupção de menores, maus tratos, favorecimento à prostituição, e os mais comuns, lesão corporal e estupro.  

O SGDCA estabelece procedimentos para assegurar um atendimento especializado e integrado às crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência, visando prevenir a revitimização e promover a proteção integral. 

Segundo o relator do processo, a área técnica do TCE-ES, que atuou na fiscalização, identificou relevantes problemas na eficácia e segurança do sistema de enfrentamento de violência contra crianças e adolescentes. “Foi destacada a urgência nas ações estruturantes para o fortalecimento da rede de proteção e bem-estar das crianças e adolescentes, sob o risco de que os direitos e as garantias, previstas constitucionalmente, se tornem vulneráveis e não sejam implementadas.”

O que mostra o trabalho 

O levantamento foi estruturado em quatro dimensões fundamentais, abrangendo diferentes aspectos da gestão e execução da política pública de proteção da criança e adolescente. Foram avaliados a Governança da política pública, enfatizando articulação entre diferentes níveis de governo; a Prevenção, com foco em ações para mitigar riscos das crianças e adolescentes sofrerem alguma forma de violência; a forma de Repressão e acolhimento, abordando intervenções corretivas e suporte às vítimas; e os Dados e estatísticas, que tratam dos sistemas e bancos de dados existentes para recepção, tratamento e análise dos dados. 

A fiscalização se baseou em examinar a legislação pertinente, a análise das respostas obtidas por meio da aplicação de questionário aos dirigentes das unidades gestoras, em entrevistas realizadas com atores dos órgãos públicos, em documentos e informações requisitados, e nas inspeções in loco realizadas. 

Após a realização dos procedimentos de fiscalização, constatou-se que há um conjunto de fragilidades e lacunas que comprometem a efetividade da prevenção e enfrentamento da violência contra crianças e adolescentes, conforme o relatório da área técnica do TCE-ES. 

As principais deficiências identificadas incluem: 

– Falhas de integração e coordenação entre os órgãos que compõem o SGDCA; 
O governo federal não estabeleceu um direcionamento claro e consistente para a implementação da política de atendimento às crianças e adolescentes vítimas de violência nos níveis estaduais, assim como o Estado não estabeleceu normas sobre o sistema de garantia de direitos dessas vítimas, no âmbito das suas respectivas competências, nem diretrizes para que os municípios definam o fluxo de atendimento dessas crianças. 

– Ausência de Plano Estadual específico de prevenção e enfrentamento à violência contra crianças e adolescentes;  
De acordo com a análise técnica, a inexistência do Plano demonstra a falta de um direcionamento estratégico para a prevenção e combate à violência infantil em âmbito estadual. Também dificulta a implementação de ações coordenadas e efetivas, bem como a articulação entre os diversos órgãos e instituições que compõem o SGDCA. 

– Déficit na capacitação de profissionais que atuam na rede de proteção;  
Foi constatado que as secretarias do Estado (SEDH, Sesp, Sedu, Sesa e Setades) não implantaram uma matriz intersetorial de capacitação dos profissionais envolvidos no atendimento a crianças e adolescentes vítimas ou testemunha de violência. A capacitação dos profissionais que atuam na rede de atendimento é de fundamental importância para assegurar que o acolhimento das crianças e adolescentes seja feito de forma qualificada, humanizada e eficaz. 

Eles precisam ser atualizados sobre as legislações, protocolos e metodologias mais adequadas para abordar os casos. Essa formação contribui para a redução do risco de revitimização, assegurando que as crianças e adolescentes não sejam expostos a procedimentos que possam agravar seu sofrimento, gerando uma violência institucional. 

– Insuficiência na identificação das fontes de financiamento;  
Foi identificada a insuficiência das dotações orçamentárias específicas para ações de prevenção e enfrentamento da violência contra crianças e adolescentes nas unidades gestoras estaduais. Em 2024, houve uma dotação orçamentária de R$ 170.539,00 para ações de fortalecimento do SGDCA; contudo a execução orçamentária foi de apenas R$ 131.040,23 efetivamente liquidado, o que representa cerca de 17% do valor atualizado previsto.  

Além disso, somente 63 municípios capixabas possuem dotação orçamentária específica para Conselho Tutelar.  

– Ausência de protocolo estabelecendo a máxima prioridade ao atendimento a primeira infância;  
Foi constatado que nenhum ente definiu formalmente um protocolo estabelecendo a máxima prioridade ao atendimento das crianças na faixa etária da primeira infância com suspeita ou confirmação de violência de qualquer natureza. Protocolos que priorizam o atendimento rápido e eficaz facilitam a detecção precoce de sinais de violência, permitindo intervenções antes que a situação se agrave. Ele deve incluir a identificação de casos, o encaminhamento para serviços de saúde, apoio psicológico e assistência social, garantindo um atendimento integral às necessidades da criança e da família.  

– Inexistência de Centro de Atendimento Integrado;  
Um atendimento centralizado e especializado permite uma resposta mais rápida e eficaz, garantindo que as necessidades da vítima sejam atendidas de forma multidisciplinar e com prioridade. A importância desse Centro é oferecer um espaço seguro e acolhedor onde diferentes profissionais (como assistentes sociais, psicólogos, médicos e membros do sistema de justiça) atuam de forma integrada, evitando que a criança ou adolescente passe por múltiplos atendimentos e entrevistas, o que poderia causar revitimização e agravar seu trauma. 

– Ausência de escuta especializada na maior parte dos órgãos;  
Constatou-se que o procedimento de escuta especializada é realizado apenas pela Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente da Polícia Civil do Espírito Santo. Também foi verificado que a Polícia Civil não realiza o depoimento especial. 

– Ausência de interoperabilidade entre os sistemas dos entes que compõem o SGDCA: 
Verificou-se que cada órgão trabalha com um sistema independente, sem troca de dados ou informações com os outros entes. Essa falta de integração prejudica a articulação e o acompanhamento dos casos de violação de direitos, dificultando a tomada de decisões e a implementação de ações coordenadas e efetivas. 

Clique aqui para ver o Relatório de Levantamento completo.

Encaminhamento 

Diante dos pontos verificados, o Levantamento concluiu que o cenário no Estado do Espírito Santo evidencia um alto risco de revitimização.  

“É fundamental que haja um fortalecimento das estratégias de governança, com a implementação de fluxos de atendimento bem definidos, aprimoramento da infraestrutura e garantia de recursos orçamentários específicos para essas ações, visando assegurar que as políticas públicas voltadas à infância e adolescência sejam implementadas de forma eficaz e coordenada”, frisa a área técnica.  

A fiscalização fez parte de um levantamento nacional, do qual o TCE-ES participou ao lado de 19 Tribunais de Contas estaduais, sobre as ações e políticas públicas desenvolvidas pelos entes do Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente (SGDCA) na prevenção e enfrentamento da violência contra crianças e adolescentes, com enfoque especial para ações na primeira infância e para a articulação intersetorial dos entes, com coordenação da Atricon. 

Com a conclusão do Levantamento, o Plenário decidiu encaminhá-lo à Secretaria-Geral de Controle Externo para planejamento de novas ações de controle apresentadas na fiscalização. 

ODS   

Este trabalho de Levantamento está alinhado com o ODS 16 – Paz, Justiça e Instituições eficazes.  Esse objetivo visa promover sociedades pacíficas e inclusivas, garantir o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis, com foco especial na proteção das crianças contra todas as formas de violência, exploração e abuso. 

Contudo, outros objetivos podem ser vinculados à temática analisada nesse processo. O tema também se relaciona com o ODS 3 – Saúde e bem-estar, com a ODS 4 – Educação de qualidade, com a ODS 5 – igualdade de gênero, com a ODS 8 – Trabalho decente e crescimento econômico, e com a ODS 11 – Cidades e comunidades sustentáveis. 

O Tribunal de Contas do Estado (TCE-ES) atua de forma estratégica para promover os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), estabelecidos pela ONU, por meio do controle externo qualificado e da orientação aos gestores públicos.  

Com fiscalizações e capacitações, o Tribunal incentiva a implementação de políticas públicas alinhadas à sustentabilidade, transparência e eficiência na gestão dos recursos. Além disso, iniciativas como o acompanhamento de investimentos em educação, saúde, saneamento e inovação reforçam o compromisso do TCE-ES com o desenvolvimento sustentável e a melhoria da qualidade de vida da sociedade capixaba. Como é o caso deste processo.  

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